terça-feira, 30 de novembro de 2010

ÉREBO

Desce o manto da noite sem cura, do absolutO sem preservação,
Manto de lágrimas silenciadas pelo prazer, pela busca voraz de satisfação sem limites,

Aí também, noite de desespero, está a pulsão...

Está nato... evidente, Tânatos da noite, nato em nós, dentro do coração, aceso como um holofote...

O que nos arrasta para a fúria? Na dança do descontrole, seja bem vindo o acidente...

A dança da morte, na pulsão de vida do Strindberg em todos nós!

O sangue não para de jorrar pela boca, pela ferida aberta em seu corpo, uma cabeça aberta na calçada, no amanhecer dos mortos, dos trogloditas que dominam o inferno, os filhos de Nix,

Os filhos antagonistas da vida, as presas canibais no cúmulo da bestialidade, filhos da Besta, na consagração máxima da irracionalidade, das cavernas enfeitadas de civilização, sofisticação anabólica da brutalidade, na covardia de uma orgia de covardes sincronizados com o medo e a destruição...

Não posso mais sofrer, não posso tampouco lutar contra a invencibilidade da ignorância tardia,

Talvez sejamos mesmo treinados para sermos fracos, e como parvos delimitar a pequenez de um diâmetro de ilusão, nos fechando num círculo por demais estreito para se respirar...A própria incompreensão se debatendo num aquário sem oxigênio...

Talvez seja mesmo apenas vaidade, e além dela não resta sequer um impulso real para nos transformarmos em algo além de esterco,

Adubo para os próximos mortos, e carne sem distinção... Nascemos felizes e morremos alienados, o que nos transforma também nos mata, o que nos liberta nos acorrenta, e o conhecimento conduz ao desespero da sabedoria, à certeza de que tudo continuará na indiferença de nosso esforço, na alegria de nossa ausência, na perversão da tão volúvel bondade humana, nascida para a caridade tal como para a inveja, sem perdão, automática, sem prazer no prazer alheio, e sem gozo fora do egoísmo, pois na superfície da pele, apenas um sente, e esse um independentemente de ser eu ou você, sentirá sozinho....

Será a solidão a ausência de amor? Ou será o amor a ilusão da ausência de solidão?

Pois então, que os olhos continuem fechados, ignorando a dor trazida pela claridade, ignorando que também na luz mora a escuridão, e que aprendemos a ver ficando sem enxergar... ficando sozinhos!

Mais uma vez, morro nos braços da sua agressão, e na sua hostilidade me faço imortal... no seu ódio, existo fora de mim, e mesmo sem precisar dizer mais nada, sangrando, terei compaixão daqueles que me morderam e arrancaram um pedaço, pois certamente, para todo o sempre, estarão infectados...

F.C.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

A Rosa Tumular

A Rosa tumular,
Adormecida,
Em seu silêncio noturno,
Transforma-se em crepúsculo
No poente da vida,
Esquecida
A Rosa adormecida,
De vida que implora
Por mais vida,
De lágrima que chora
Por mais um dia
Apenas,
Que seja lhe dada
Rejuvenescida
O prazer de se ter
O retorno daquele que foi
Para longe dela,
Sob seus pés,
Embaixo da terra
Adormecer
E nas raízes do incógnito
Envelhecer sem tempo
Sem hora,
Aquele que partiu
Para a lágrima inatingível,
O soluço intangível,
Do amanhã inalcançável,
Para uma rosa que chora,
A Rosa tumular
Em silêncio sensível,
De um amor perecível,
Plantado em meio de trevas
A Rosa negra da morte
Em seu silêncio intraduzível
Desdobra-se a cada dia,
Em pedaços
Se transforma em agonia
Com os pés descalços
Cruza a tempestade dos sonhos
Atravessando os encontros
Rodeando-se de prantos
De buracos tantos, que no simples desespero
De se sentar para jantar
Expressa todo lirismo decadente
De suas pétalas envelhecidas
Em lágrimas no vaso
Recortada imagem
Da beleza raptada
Selvagem
E podada para o eterno
Na prisão de um apartamento
Desmoralizado convento de santos
No eco do pranto
Se desfez como o quadro
Morto de Siqueiros
Onde os bebês estão mortos
Onde o resto da humanidade
Definha-se na sucata humana do desespero
Na lágrima mundana de um enterro
Para todo o silêncio do mundo
Se manifestar
E sem possibilidade de resgate
Nos caninos dos vermes
Naufragar,
Esquecer
Morrer,
Talvez perecer antes do tempo
Mas que tempo?
Que esforço que não seja ilusão e tentativa
De Adiamento?
Mas para que?
Que Rosa tumular não nasceu para morrer,
E enfrentar seu enterro?
Rosa de Siqueiros
Num país de araras sem donos
E vozes em baías de coqueiros
Lamentáveis
Versos de desespero
Na Explosão da Cidade
Na Fúria da Tempestade
Perdeu essa Rosa um amor
Na indiferença cruel de uma troca
Do que não tem mais volta
Do que não fala
Do que não se diz
E mesmo assim todos escutam
A cada dia, a cada hora
No abandono constante da carne
Vulnerabilidade do corpo
Em deplorável doença
Pétalas de imunidade
Na imunodeficiência
Do amor sem resposta
A ida sem volta
Sem volta
Sem hora
A Rosa de Lenora
No umbral do silêncio imortal
Pergunta essa Rosa tumular
À ave atemporal
Que pousa em seu ombro
O eco do pranto
De todas as lágrimas de todos os corpos
Pergunta essa Rosa de Lenora
Para todos os corvos:
- Será dada uma chance?


E foi quando que a ave imortal
Ao olhar de relance
E enxergar o fatal
Desespero para fora
De seu alcance
Responde fraternal:
-Sim minha flor,
Será dada uma chance!


E mesmo mentindo
Calando sua dor,
A ave fingindo
Que ali estava, celestial
Lhe chora sorrindo
Encobrindo o temporal
E trazendo o romance
À Rosa de Siqueiros
No Eco do Pranto
E quando muito,
Minha flor, lhe digo somente:


-Descanse, descanse !!


E grito fremente
Para que prossigas sem aviltar
A pureza inerente
Para que eu afiance
Um resquício de alegria
Nesses olhos errantes
De trágica poesia
E temperamento inconstante
Mas por favor,
Rosa tumular
Não venhas mais me perguntar
Se será dada uma chance,
À mais infeliz das floras
No infinito banimento
Do tempo que arde sem hora
Da lembrança de ontem
Que irrompe no agora
Presa no abismo dos canteiros
Onde todas as almas
Perdem-se nos mesmos erros
E enterram-se
No mesmo desespero
Em lágrimas incontáveis dos dias
Que passam,
E passam,
Inabaláveis e serenos
E tudo é igual
Na serenata do silêncio
Tumular
Rosa da Terra
Enterra-se sem poder
Interromper o final
E tudo é igual
Com o gosto de terra na boca
Terminamos sem querer
O tempo sem hora
E talvez sem tempo
De amar
O silêncio em nós mesmos
Na Rosa de Lenora
Quando a ave imortal
Na cadência das horas
Sem aviso pousar
Junto ao silêncio
Que nos esquecemos de escutar
Sem mais tempo para amar
Na cadência das horas
Fora de alcance
Na voz de um grito
Quando a ave de Lenora
Trazendo em seu bico
A Rosa tumular,
E mais nenhuma chance...
Em silêncio nos dizendo, agora:

- Descanse,
...descanse!



Fernando Castro

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A Rosa em Silêncio

A Rosa,
Inominada...
Cravada numa tela sem tinta
Sem voz,
Num quadro sem som
Quando na ausência escarlate
Dava-se o tom,
E o xeque mate,
Sem voz
Sem teto,
Sem vida,
Um ventre morto
Sem feto,
Um olhar absorto
No cume do silêncio
Sem voz
Sem nada
A tinta e a noz
De Édipo Rei,
Sem lei,
Absurdo
Cego, não enxerga o pintor
Surdo,
Não escuta os próprios gritos de dor
O terror
De calar o indizível
De sentir o inexprimível
E de ver
No escorrer das tintas no pincel
O laurel de espinhos
Buraco negro no céu,
E sozinho
Perceber o silêncio na solidão
O vasto mundo sem voz
Por debaixo de todas as telas
O vazio inominado
Por de trás de todas as cortinas
As lâminas de faca sem misericórdia
Por de trás de todas as retinas
Quando todas as crianças adormecem,
Nos travesseiros dormem as guilhotinas
As crianças também estão mortas
E a infâmia as faz perecer antes do sexo
O preconceito sem razão
As faz enlouquecer
Antes do belo gesto
De se deitar,
Livres,
E virgens, se perderem como as rosas
Esquecidas na prateleira
De uma jardineira sem pudor
Num gramado sem distinção
Onde o sangue de amores proibidos
Escorre como a tinta na tela
E pelas mãos
No desejo do pintor
Sem nome,
Sem cor
A rosa é cravada numa tela sem tinta
No veneno da aquarela
A dose letal
O embrião que caiu da janela
O filho que se perdeu no vagão
Descarrilado,
No silêncio da solidão
Sem nome, sem cor
A rosa cruz cravejada na pele
A luz e o calor
Do silêncio da vida
A Rosa do amor
Em pétalas de diamantes,
Onde esconde-se o rosto
E os belos amantes se beijam como vaga lumes na escuridão
Como enfeites de natal
Para olhos faiscantes,
Em nome do pai,
Sem medo da polícia
Os meninos perdidos na dor
Revelada, machucada,
Os meninos escondidos na flor
Envenenada
No silêncio da Rosa
Perdida,
No centeio do campo de silêncio
Uma trilogia
No triângulo da incomunicabilidade
Da tela, da morte vivida a cada dia
A flor de narciso
E sua metamorfose
Surrealista,
Num silêncio a perder de vista
A vastidão desértica
Costurada no interior
Por debaixo da carne
Dentro da cela
O silêncio da Rosa
Sem voz
Cravada na tela
Inominada
Sem voz e sem cor
O silêncio da dor
De ser um só
Quando no pecado de todos
Existe o mesmo silêncio
De ser nada mais do que pó
Areia colorida,
Espalhada na praia
Onde os corpos desolados se amontoam
Em ilusões de conectividade
Em barracos humanos
De hiperatividade
Com um único fim de iludir
Por não suportar
A real condição de ser
E saber
Do silêncio do pó
A indelével dor de ser um só
Na agonia de uma rosa infinita
Congelada para sempre em si mesma
Sozinha
Em sua sonata ao luar
Um desespero que finge amor
E a eterna dor
De vagar, de vagar solitária
Sucumbindo a cada instante
Devagar
A cada sonata
De rosas em silêncio
Que morrem sem deixar vestígios
Sob a luz tumular
De uma noite ordinária
Na solidão do luar



Fernando Castro

O Silêncio das Rosas

O silêncio das rosas,
espalhado como catedrais de cinzas,
Encaixotado pelos sepulcros humanos,
Em horas bestiais,
Diz com seus versos mudos,
As dores e absurdos que as palavras vossas,
Na voz do submundo
Com tanto esmero calais,
Calais,


O silêncio do hiato entre ser e almejar
Entre querer e conquistar,
Te faz um reflexo,
De um vazio agudo,
Na íris encharcada no olhar de um mundo,
Onde, sobretudo,
O teu encanto se desfaz,
E por hora de juventude,
Não volta nunca mais...


O silêncio, consumidor da tua paz,
Na cor lacrimosa
Desses olhos de rosa,
Vence calado e tanto faz
Que na áspera ausência de palavras
O teu gozo ou desprazer
Insista em não dizer
O que esses olhos sem saber
Chorando revelais...
Revelais,


Revelais vossos olhos,
A dor de não saber para onde olhar
E, no entanto,
Ainda piscar de tanto sentir
Um deserto a enxergar,
Uma areia movediça nos olhos,
Que se calam,
E não olham para outros olhos
Sem ver não dizem o que enxergam
Gritando lágrimas sem cor
No silêncio de rosas
Que quando calam,
Choram as lágrimas já mortas,
E quando falam,
Choram os mortos já em pó
Enrolados nas tantas notas
De veias e de sangue
De artérias e aortas...


Parando o fluxo de um coração
Para sempre silenciado,
Choram essas rosas as lágrimas de um soldado,
Para sempre desarmado de sorriso e respiração,
Na transpiração das flores da morte
Que quando caladas,
No coro da noite esbranquiçada
Choram sem dizer não
E no choro da razão esfumaçada
Choram sem controle
No sabor da maldição em vício
Trazendo ao paladar da vida
A indulgência do perdão
De todas as noites
O mesmo pedido
Todos os ratos
Contraídos,
Roendo as próprias almas, morrem sem dizer
Eu também posso ser fraco
E na fortaleza do meu poder
Eu também posso ser silêncio
Na ânsia do meu dizer
Na floresta de rosas
Posso ser
Espinho sem corte
Ou na seca de um galho
Posso ser sem vida
O espelho refletindo a morte
Na aparência ingênua de uma pétala
Ou na aparente ausência de uma técnica
Posso ser a voz que derruba o grito
Cética,
No doce ponto e vírgula de uma janela um tanto poética,
Para o jardim de minhas seringueiras
Olhos de jabuticaba em sua aparência profética,
Posso ser o silêncio das rosas
Que quando falam
Choram heréticas,
Toda beleza que pode conter a liberdade
De ser sem ter que nada dizer
Simplesmente por ter tudo dentro
No infinito ser,
Que ao menos chora,
E mesmo às vezes,
Quando, sem lágrimas de rosas,
Cora,
se lembra de agradecer
Todo o silêncio que conseguiu escutar
Nas conversas com as tantas almas
Que seus olhos enxergaram pelo mundo
E mesmo sem morrer,
Em silêncio,
Como uma rosa no meio da chuva
Conseguiu ver...
Logrou de ouvir o amanhã
E de saber que todos os mortos ainda vivem
Em silêncio
Em tudo que não é dito
E tudo o que importa
Também não está lá
Entre a dor das palavras
E o eterno silêncio
Das lágrimas mortas

O silêncio das rosas!



Fernando Castro

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Inominado,

Na sua poética intraduzível da indiferença também aprendi a abandonar,
E no descaminho que a todos toca,
Aprendi a fingir um sorriso quando o coração arde de fome,
E mágoa de saber que também em ti,
Amigo das bolhas espumantes,
Carece um sorrir para se alegrar além das aparências,
Um pulsar, por mais efêmero e fugaz,
Que de fato esteja imbuído de preocupação,
E uma risada desprovida de piada nas minhas ausências,
E ironia mordaz
Nos intervalos que estamos juntos!
Amigo da fome e do desespero,
Um dia me ensinou a dividir um pedaço de pão,
E assim o fazendo,
Ele se multiplicava como um milagre...
Mas esqueceu de me ensinar como não devorar
Sozinho,
Todos os pedaços!
Um dia me intuiu que seria para sempre
E convenceu minhas inseguranças a naufragarem no mar de seu peito
Para nunca mais,
Mas ai também,
Inominado,
Esqueceu-se de mostrar que esse mar não era raso,
E que todas elas voltariam à tona de acordo com o capricho imperscrutável da sua maré,
E nas minhas lágrimas de impotência,
Confirmou que para sempre não existe,
E que talvez,
Ao teu lado
Nem mesmo o amanhã... Inominado,
Calaste nos meus olhos o que berravas para o mundo,
E esfriava em meu ventre
O que um dia era seu maior motivo de orgulho,,,
Nada mais além de uma cena simples e delicada
Da lembrança sem fantasia
De nós dois caminhando pela praia...
Pela ardência do calor indireto do sol,
Esquentando nossos pés e inchando nossos corações de um vermelho fogo intraduzível...
Reanimado pelas saudades,
E pela minha certeza de que um dia me amou...
E mesmo que por um instante,
Nesse dia eu existi ao seu lado,
Como um cúmplice de toda verdade que esperavas de mim,
Inominado amigo,
Mas que após a saturação de teus paradoxos,
Não enxergavas nem mesmo em você,
Defeito sem propósito,
De propósito efeito
O carregar para fora de mim a possibilidade de crer em ti,
Festeiro de todos os santos,
Mago de todas as religiões, onde no altar das contradições
Guia-se pelo totem do seu interesse,
Do seu preconceito faceiro,
E conveniente,
Amigo do peito
Esmagado,
Do peito onde o músculo vital foi arrancado
E do coração fizeram-se as tripas
Meu gigante inominado
No abando de si mesmo ainda resta uma lágrima de mim,
Escorrendo solitária, com frio
No gelo do espelho onde teu rosto esqueceu sua imagem
Maquiagem dos sonhos,
Na ilusão de nós dois
Um pouco de mais pó na cara
E base,
Mais base para sustentar a beleza
No peso da incoerência
E esconder os vincos de traição,
Desmascarado
Inofensivo,
Amigo Inominado...
Assim,
sem palavras na boca,
Despeço-me com um beijo
Sereno, sincero...
E torço que para nas inverdades de teus julgamentos
Algum dia deixe de acreditar nas mentiras
usadas para justificar
o Inominável
nas entrelinhas das letras que juntas escrevem
Amar
E que soltas,
Jamais teriam escrito sequer uma sílaba
De Desprezo



Para o meu amigo imaginário,
Que me abandonou quando o sonho virou pesadelo...
E quando nos teus olhos de sempre
Te vi Inominado!



Fernando Castro

terça-feira, 16 de novembro de 2010

2001: la nave que se vá


Como num sonho, a grande nave continuará sua jornada, independentemente de lembrarmos dela ou não. Como o sonho continuará sendo sonho, mesmo quando esquecido de ter sido sonhado. Talvez quando lembramos que o sonho é sonho ainda sonhando-se, ele se torne mais real, pois se aproximará do que de fato é; como na vida, quando lembramos que é vida ainda vivendo-se, se torna ela mais vida, mais cor e mais precisão. O infinito continuará sendo infinito querendo nossa razão contemplá-lo ou não , podendo esta alcançar seu fim ou não, ele continuará lá, para sempre, de onde veio, e para onde caminha, intocado pelas nossa certezas, inatingível pela nossa ciência, apesar de perscrutado pelo pensamento sem fim, incomensurável, que também nos habita, que também se pensa ser sem fim, pois dentro de nós, também está o infinito, vivo, em sonho e em realidade, misturando os absurdos da nossa finitude com vozes que destinadas estão a não se calarem nunca mais. Para o resto da vida, mesmo surdos para o mundo, ouviremos nossos fantasmas, mesmo sem fé, estaremos acompanhados e o peso das correntes ainda se faz ouvir balançado nos esboços de uma escadaria que todas as noites temos que cruzar para atingir o outro lado da escuridão, onde a luz não penetra nem para esquecer a dor de ser treva, e nada existe lá além de nós em plena contemplação de nossa solidão absurda, por ser ao mesmo tempo, tão impossível de ser real. Para onde vamos certamente condiz com o lugar da onde viemos.  Será que temos alguma idéia? Será que importa, ou que fingimos não se importar justamente porque importa por demais para deixar de se fingir um sorriso, e sorrir-se? Penso nos chips e na nano robótica... Será isso o infinito dentro de um mundo visível... Será apenas conceito e improbabilidade, ou o invisível esta sendo criado por nós para se infiltrar em nós mesmos, ao ponto de termos sentinelas nas veias se comunicando com o espaço? 2001 em sua perfeita odisséia inacabada, sem fim! Ali estava o infinito e o eterno retorno, ali estava o incompreensível alinhado com a poesia da musica e da imagem: penso em Strauss em seu Danúbio azul no celeste da Terra, e o mesmo Danúbio quando numa cena de La nave va, uma gaivota surpreende a mais alta casta de refinamento humano de uma época hoje morta em seu almoço. Com o pedigree do inesperado ela devasta o linear daquele salão com a mesma fúria que a autonomia de uma máquina rebelde desconstrói o previsível numa missão espacial. A nave de Fellini versus a nave de Kubrick, em paralelo no tempo que se dão, em transversal, no ponto que se cruzam, ambas em rumo ao desconhecido sondável pela razão, limitado em um destino, porém cercadas pela imprevisibilidade do mundo e de tudo que tange a existência. Uma em rumo a uma ilha para se dispersar as cinzas de uma voz, a outra, à Júpiter, para possivelmente se aproximar de uma resposta para as cinzas. Aquela pairando sobre a onipotência do oceano, absoluto e desconhecido, esta, cortando o ar sem gravidade, atravessando o mistério do espaço e seu infinito, sua perplexidade insondável. Ambas cercadas pelo incompreensível e pelo absurdo. A imprevisibilidade no timão dos acontecimentos. O inenarrável, já em Beckett o Inominável, e  em Ionesco, vejo seu rinoceronte desfilando pelo deck  do Gloria N., a nave que vai, e fatalmente, como sua irmã astronauta, não volta nunca mais. Rumo ao futuro, que não regressa ao passado, e que ao mesmo tempo, é conseqüência deste numa análise onde se abstrai o tempo e verifica-se que nada volta para lugar nenhum, quando nada vai, nada retorna, pois tudo acontece ao mesmo tempo, a ida e a volta, a vida e a morte, o infinito e o fim. Tudo é possível, e não existem limites. Não existem ponteiros. Por que não existe razão nem resposta para se limitar o improvável. Não existe nada de real além do gozo e da alegria de se pertencer a um instante tão alucinadamente quanto se pertence a uma noite de sono. Não existe memória que não possa ser criada, e desejo que não se realize, quando de fato se sabe o que desejar. E o que é saber desejar senão ir de encontro consigo próprio cada vez com mais precisão e sabedoria nos detalhes, cada vez com mais experiência e controle das perfeitas imperfeições que de fato não estão lá, e nada são além de meras aparências espectadoras da sua distração, do desvio, da luz que não refrata ao cego que morre de tanto ver, e mesmo assim, implora para nascer cego novamente? Strauss inaudível, surdo no espaço, colorido em todos os tons da Terra... assim ouviu Zaratustra em seu desejo, em sua metamorfose de Kubrick, que nos revela sem máscaras, e sem necessidade de temer o que não se sabe, de dizer o que não se aprende calculando máximas inverídicas num ábaco de prepotência e vaidade! Podemos muito mais do que “esqueletos que procuram aquecer-se” ou que disputam um enforcado na pintura de James Ensor, que escancarou as máscaras mórbidas do absurdo mordaz humano de se enfeitar com morais fadadas ao pó, ou com o tempo burlesco de convenções que retira do homem seu gesto natural de ser homem e o aproxima da carnificina de si mesmo. Não há o que julgar, e os canibais têm o direito de se devorarem se assim o quiserem. Não me digas como devo amar, apenas ame.  O que nos resta depois do silêncio? No vacum do espaço nossas palavras se desmancham sem sentido, porque brigar por um fora dele? Absurdo é sempre ter que justificar, absurdo é dizer não para os náufragos sérvios na iminência da 1ª guerra mundial ou na iminência de qualquer coisa. Como supor o confronto com a marinha austríaca ou a rebeldia de um computador projetado para obedecer, e mesmo supondo, como abandonar o humano a sua má sorte somente por que enfrentarei a proporção contrária? A antítese sempre se manifestará ao longo da vida por estar em sua essência, e da comunhão também virá a solidão, como da paixão o desespero, e do amor, a inevitável dor, de se amar, e de não se amar mais. De morrer sem conhecer tudo, quando de fato, só temos a nós mesmos para conhecer. Impossível não se entregar. E na alegoria do espaço ou do oceano, sendo o turbilhão de vida que nos cerca, de desejos,  convites, e mundos, e quartos e salas de jantar, sendo um navio ou uma espaçonave, nada mais é do que nós no meio da vida. Essa nave sou eu, e esse navio é você. Sendo que la nave va para o infinito, na odisséia do espaço de nós mesmos, que se confirma a cada dia, a cada hora, a cada instante esquecido de ser marcado pela imprecisão dos nossos relógios assombrados pela precisão incontestável da vida. Que venha o início, pois jamais foi tão mágico se aproximar do final.

Fernando Castro

em 15 de novembro de 2010, uma odisséia no quarto!!

terça-feira, 9 de novembro de 2010

O velho frasco e o fresco vazio

Era manha vital de doce novembro, quando a primavera invadia as jardineiras, e um sorriso de flores se espalhava pelo jardim.

O vazio, imemorável, esquecendo de devorar mais um pedaço de ti, meu amor, deixando-te um dia mais para o esquecimento, lamentava as sobras de tua voz, insistindo em envolver-me pela cintura cada vez que cometia o crime de me lembrar de teus lábios molhados, gigantes, intocados pelo tempo e seu bisturi do envelhecimento, sua lamina de acaso, quando se desmancha a beleza sem tocar, quando se ama o inverno sem semear o gelo e a neve por de trás dessas tuas pálpebras frias , glacialmente afastadas do centro de um coração!

não sei mais se posso convalecer junto de teus braços, e sendo assim, também sinto que não mais posso pensar em continuar ao teu lado, meu anjo sem rosto, sem gosto de esperança...

o vazio é abominável, e se espalha junto ao frio da manhã,
a chuva não tem intenção de parar,
e o nosso lar também não resistiu...,
vazio,
como um candelabro de gelo que caiu no chão,
algo partiu,
para nunca mais voltar,
como uma estátua fundida que volta a ser pedra,
essa dor se misturou no espaço,
e esse amor se diluiu no negro da escuridão,
na sobrevida do esquecimento,
não há mais reconciliação
nada mudará, e no tempo ainda perdido quando gasto para lembrar
vejo teu reflexo
como um mapa borrado por uma rota já gasta
vejo o teu reflexo
insistindo em iludir, lutando para refletir o que já basta
o que não ilude mais,
o que iludiu
o que hoje cicatriz
deixada na carne
para sempre
o remorso
e o vazio

f.c...

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

RAINHA DA SOLIDÃO

Rainha da solidão,

Deseje uma vez mais a minha partida, em cada encontro, em cada submissão de um olhar, deseje uma vez mais a minha transpiração solitária, muda, transparente na ingenuidade de um sorriso sem provocação, de um até logo sem despedida num beijo sem gosto de desejo, sem intenção,,,,

Rainha noturna,

Responda os meus dias em cada amanhecer, em cada gosto de madrugada sem companhia, e assista a decadência da minha vida social no isolamento que cada por do sol carrega em sua luz,

Crepúsculo dos anjos, dentro do mesmo quarto de hora, a cada hora, dentro do mesmo quarto sem paredes de lembranças acompanhadas pelo convite inesperado de sua presença, de seu hálito sem ofensa e medo de estar só...

Sim,

Carregue-me nos braços pelas mãos da comunhão, pelo obscuro lado do abandono, da casa sem lar, do diabo sem cruz,

Na calefação da esperança contaminada pela fé, deseje uma vez mais a minha partida, e implore minha presença num átimo de solidão sem ausência, de vida sem morte, de metamorfose sem dor,,,

Escreva nos teus lábios o segredo para não estar só... O convite para falar sem palavras, e viver novamente um instante desfalecido pelo tempo sem proteção, com a medida do entendimento desprovido de dúvidas, e respostas revestidas de segurança...

Não agüento mais sem ti,

Não posso mais sem saber o depois,

Venha até mim e me arraste das chamas sem contenção,

Rainha das pupilas tímidas,

Sóbria enlouquecida

Rainha da solidão,

No desespero das mãos que se unem

Do querer que expressa um não

Sem querer, sem porque,

Sem entender o que de fato estás a dizer

Com aquele gole, com aquela flecha travada no calcanhar,

Venha sem resposta, mas venha na dádiva de dar

De pertencer, de se saber que mesmo na fome

De vida e ânsia de mais vida

Não se precisa morrer



Não precisa se condenar ao luto infindo

E a distância amarga de uma nota sem dó

Sem início e sem redenção

Rainha da amargura

Em lágrimas de pó

Das noites em trevas

Rainha da solidão

Me condene a tortura sem fala

Mais ao menos me deixe ao abandono de um irmão

De um único desespero sem o sentido da inverdade!

Abrace os meus ossos

E diga para esse alguém

Que também sinto saudades

Que na lágrima de soluço

Tento dizer realidade!

Por favor,

Mesmo no passado

Olhes para trás

Na tempestade humana

Do centro de um furacão

Olhes para os pedaços que juntam um só

E neste interminável condão

De sentimentos não ditos

E ofensas sem perdão

Responda que sim

Rainha da solidão

Responda que ainda me resta uma mão

E um corpo de alma

Nas entrelinhas desse mistério

Que a vida chama

Paixão

Mas que eu

No absoluto impedimento de mim mesmo com todas as faces da existência

Chamo loucura e impossibilidade

De paz e silêncio

No eco perpétuo

Das vozes da solidão



FC

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

NOSTÁLGICOS

Sem tréguas, o vazio de uma piscina cravada no asfalto, no mergulho de pedras esquecidas por uma pedreira de homens e crianças afogadas...

Assim é o destino, inextrincável banimento, assim são as lagrimas, ausentes também nos olhos, as duas piscinas vazias carregadas por um tremendo peso de carne e osso por milhares de dias... por incontáveis instantes de incompreensão e exílio,,,

A própria carne exilada para sua perene decomposição, os proprios ossos condenados ao cadafalso de um túmulo advindo com o parto, com o obscuro por trás de cada sorriso, com a lágrima invisível na profundidade dos olhares rasos, secos, e ao mesmo tempo, úmidos de silêncio e desespero,,,

Não podemos explicar as velas queimando no infinito do jardim,

Os pêssegos apodrecendo sua beleza na distância opaca de uma árvore...

As folhas se despendido de uma rosa no indecifrável caos de um temporal

Lagrimas serão o legítimo substrato da alma, quando esta se revelar sem mais desculpas para espelhar a autenticidade que aprendemos escolher

Dor o desvio inevitável que certamente voltará ao início quando nos depararmos com o todo em tudo que sempre foi fim

O choro se confunde com a chuva inexplicável, e a pele com o adubo orgânico semeado em torno dos berços... das tantas bandejas nos berçários refogadas com fraldas e bebês

Corpos nada mais são do que indiferença e obsessão entre si,

Uma lavoura de almas enfileiradas num arado de medo e prazer

Dor e desejo

Medo do infindável desconhecido,

Prazer pela célula consciente da percepção

O Eu sensorial

Esquecido debaixo da tempestade, seduzido por cada uma das formas insaciáveis descobertas para sempre, sem freio, sem repetição, sem possibilidade de retorno

Toda filosofia continuará em parceria com a loucura,

No pensamento abstrato de uma angústia por demais concreta

A morte é mais um prazer que aprendemos a temer

E no fundo,

Será ela a única resposta que trará alguma solução...

Sendo assim

Aprendendo a morrer,

Arrancamos dos nossos pescoços todo o nó umbilical para sempre enrolado em nossas gargantas

E quando menos hipócritas

Morremos mais felizes,

Celebrando a liberdade

Que finalmente resolveu nossos grilhões cortar

No tão esperado dia de finados...

Nos dando asas em baixo da terra

Transformando os nossos sonhos em pó!

Assim cantaram os corvos

No dia do meu funeral...

Assim cantaram os anjos,

Na noite do meu amanhecer!



Boa noite


fc

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

O que trago de mim?

E mesmo assim, ainda dou mais um trago…

Mesmo sem lábios para apoiar o cigarro, faço questão de sentir a fumaça e despejar o calor do seu batom em minha boca... faço questão de enlouquecer com uma valsa surda para os mortos, esquecidos na indiferença do que viveu ontem, e se esqueceu de morrer de novo...

Não mais tenho como fugir da vida, mesmo sendo tragado por ela a cada instante, a cada respiração, a cada trago no cigarro de si mesmo, manchando os dedos de amarelo e a alma de vermelho...não tenho mais como dizer não!

Manchando os lençóis com a toda a aberração que o desejo pode trazer a tona, em gargarejos sanitários, em descontrole proposital, perdendo a vergonha que atrapalha o erro, e tira do gozo o gosto de prazer... perdendo o medo.... desligando a trava que mora dentro de nós

Não tenho como fugir de mim mesmo, mesmo perdido no absoluto de meus extremos, na incoerência da duvida e da falta de sentido, no não sentir quando tudo se sente, quando tudo se abraça sem saber como encostar...

E mesmo assim, ainda dou mais um trago

Em dia de mortos que ainda vivem, e se entranham dentro do nosso pensamento como vermes revelados em baixo de um toco podre num pântano de crianças envelhecidas, de adultos inconformados, de velhos enlouquecidos...

Mesmo no auge da contaminação e na imperiosa necessidade de banimento, mastigo o pó amargo da própria existência sem voz, muda de desejo e vontade, cega de discernimento, e surda ante o mínimo comando que pede uma resposta...

Na imobilidade me atrofio, e sinto que algo ultrapassa meu corpo como um gancho que suspende minha alma para fora, tira as minhas vestes, e me coloca na posição de marionete sem maquiagem, sem músculo livre de um cordão...

E mesmo assim, ainda dou mais um trago

E mesmo assim, trago o desespero para dentro de casa, quando vivemos uma alucinação e já não sabemos em quem confiar, muito menos quem somos, e o que fazer com tudo isso que sentimos quando reiteradamente giramos nossos dias no subconsciente das mesmas perguntas, quando antes do ponto de interrogação, deparamo-nos com a face gélida do vazio abominável...

Tudo é vazio, e ao mesmo tempo, tão cheio de vida...

Tenho medo de não ser mais nada, e não ser o que sempre quis ser

Livre

Tenho medo de morrer enquanto vivo

E permanecer na escravidão do acaso atemporal

Num frasco de perfume barato, engarrafado como um aroma pobre sem fixador

Tenho medo de dar o próximo trago, e antes de acordar para a vida

Me deparar com o velório de mim mesmo

Onde nada restou para tragar

E mesmo assim,

Nesse encargo perpétuo de suportar o que somos

Sem anistia ou indulto

Ainda dou,

Lastimável

Um último trago



FC

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Voz e paixão

Eu tambem quero amar,
e nao só sentir,
mas dividir esse desespero com todos que me cercam!
Desespero por estar preso numa caixa onde o vício maldito abomina a expressão,
onde o carinho espontâneo se transforma em paranóia...
Quero muito mais do que o simples contato raso num dia de mortos,, numa festa de bruxas!
Finados são as nossas emoções que não conseguem explodir na realidade todo o tesão de estar vivo.... respirando com vocês a ausência do medo, o calafrio em goles que se desmancham em álcool , o abraço sem cotovelos, onde o ponto de apoio se transforma em fumaça de pedra e sorriso...
Todo o resto é morte, todo o sangue é vida... tudo ao redor é desejo e vontade
Só me resta dizer obrigado, por sorrirem de volta, por fazerem a confiança acontecer, por me darem um abraço...
Só me resta tudo que tenho, pois o que perdi nunca fez parte de mim, e o abandono nada mais é do que o medo e a insegurança de não completar a partitura de vida que me deram para dançar....

Show me from behind the wall

As folhas continuam caindo, e as árvores sem tempo vão acabar envelhecendo, quando no fim da estação,as lágrimas também sofrerão o outono infernal,
Nada mais nos separa,
Experimentamos o gosto de se morrer nos braços de um desconhecido
Numa bolha de sabão destruída pelo simples toque,
Uma cápsula, sem direito
Sem freios
Sem condição de se manter eterna, sem sopro
Uma real possibilidade de ser amado,
E devolver para esse mundo todo o sonho
Do pesadelo de viver sozinho

Uma última vez
Obrigado por confirmarem a minha existência
Me dando um sentido para dizer
Sim
Eu estou vivo!


FC